Ouço-te no meio da multidão mas não te consigo alcançar. Reconheceria o teu riso no meio de qualquer festival. Aquela tua gargalhada curta e decidida, como se só deixasses a tua alegria sair aos poucos.
A minha é estridente e faz-te cerrar os olhos. Como um tremor de terra, disseste-me tu.
Curioso que é mesmo assim que te vejo na minha vida. Chegaste de repente, abanaste tudo, as minhas fundações cederam.
Depois de olhar para ti pela primeira vez senti como quando se sai à rua depois dessa catástrofe. Tentas reconhecer as coisas à tua volta mas não te consegues encontrar.
Lembro-me tão bem do dia em que nos conhecemos. Quando te vi entrar na mesma sala começou tudo a tremer. Quando os teus olhos cruzaram os meus começou aquele barulho que vem das entranhas da terra. Uma força maior do que tudo. Durante os primeiros instantes não sabia se me tinha de proteger ou ver o que acontecia.
Não sabes se está de facto tudo a tremer ou não.
Quando olhas para mim sinto as ondas do mar lá no bugio. Sinto-me como o marinheiro sozinho dentro desse farol, que tenta ser forte no meio de uma tempestade. Mesmo quando desvio o olhar, sinto a água do rebentar das ondas na minha cara, os meus cabelos que escorrem e os olhos que se embaciam.
Mas quando o nosso olhar se encontra sinto-me no olho do furacão. Um silêncio total e um caos que não nos pertence. Sorris e estendes-me a mão.
Vejo-te tão perto mas não te consigo alcançar.